domingo, 27 de maio de 2007

Realidade Irrelevante

Da minha janela eu não posso ver o mar
Nem posso ver árvores ou pássaros
Nem crianças brincando
Nem pessoas ou carros ou avenidas
Minha janela está voltada para uma parede fria
Fria e acinzentada que esconde boa parte do céu
E é feita de concreto maciço, real e inconfundível

Dessa varanda eu só posso ver telhados cobertos por fuligem
A mesma fuligem que apaga as estrelas
Que antes estavam bordadas na cúpula celeste
Meu coração guarda em mim o que os meus olhos já não podem ver

É meu esse mar, essas árvores e esses pássaros e todas as estrelas
E tudo que é belo que há no mundo
Que me importa esta janela ou esta parede e essa fuligem
Que me importa a escuridão
Se eu sei que existe uma luz que brilha em algum lugar
Essa luz é minha, todas as luzes são minhas e tudo que há no mundo
Guardado longe dos meus olhos, eu sei
Mas todas as coisas e pessoas fazem parte de mim o tempo todo
E todo ser humano é um pouco o que eu sou

Que me importa nunca ter visto um navio
Ou nunca ter ido à lua
Eu posso ver as nuvens cobrindo a terra num enlace carnal
Que faz nuvem e terra tornarem-se vivas
E posso ver agora... que me importa nunca ter andado de avião
O céu habita em mim e é só meu

E eu sinto o calor de todos os vulcões que nunca toquei
E o perfume de todas as flores que nunca pude cheirar
E a corrente elétrica de todos os raios que nunca me mataram
E toda a dor e a alegria e a esperança
E toda a paixão de todas essas pessoas que nunca conheci


E posso sentir você...
Misturado a uma multidão de pessoas que são minhas
Sua alma também é minha
E o mundo é todo meu

Que me importa essa janela...

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